Atualmente, trabalhar sobre duas rodas no setor de motofrete brasileiro significa viver em risco constante, a incerteza de chegar em casa à noite e, ainda por cima, ter que lidar com a indiferença e desconfiança da sociedade. Mas, quem vive da profissão garante que a liberdade e o amor ao ofício ajudam a superar os obstáculos.
Importantes para a atual economia, já que somam quase três milhões de trabalhadores em todo Brasil, eles estão por todos os lados no caótico trânsito das grandes cidades levando documentos, pequenas mercadorias, refeições, jornais, revistas, remédios e até sangue, como órgãos vitais. Também estão nos médios e pequenos municípios prestando serviços de entregas nas ruas onde lutam (e desafiam) os perigos, preconceito e por dignidade. Entretanto, por não existir dados oficiais, é impossível saber a quantidade existente e que realmente sobrevivem das entregas rápidas. Porém, se é difícil saber quantos são, fácil saber é que todos sofrem discriminação, já se acidentaram pelo menos uma vez e que contam com pouca solidariedade nas ruas, a não ser dos motociclistas que param para ajudar em caso de acidentes.
Apesar dos riscos, os que possuem carteira assinada tem piso mínimo na maioria dos Estados, recebem aluguel da moto, adicional de 30% sobre o salário, VR, seguro de vida e cesta básica, entre outros benefícios. Os irregulares ou clandestinos vivem à mercê de quem paga por serviços baratos e, em caso de acidentes, ficam a própria sorte. Por mais que se esforcem, “inconsequentes” ou “perigosos”, são alguns dos termos usados pelos motoristas para defini-los.
Respeito acima de tudo. Se existe lei, por que o desrespeito?Eles perseguem no dia a dia seu sustento, porém, os motoboys querem respeito e ser vistos como profissionais, até porque, desde 2009 a Lei Federal 12009 regulamenta a categoria e dá “cara” ao setor. Para se ter uma ideia da seriedade da lei, existe a obrigatoriedade de realizar um curso de 30 horas do Contran para que o trabalho seja legal.
O motociclista Rogério Sobrinho, 32 anos, que trabalha como motoboy registrado em uma empresa durante o dia, a noite, entrega pizzas no Planalto Paulista, Zona Sul da Capital. Esforçado, é motoboy desde os 18 anos e já viu quase de tudo nas ruas, porém, o preconceito ganha de longe e muitas vezes, sente-se discriminado. “Faço cerca de 15 entregas por dia e umas 25 a noite na pizzaria e, na maioria, as pessoas sequer olham na nossa cara e não entendem que tenho dignidade e orgulho de meu trabalho”, diz com tristeza o motoboy.
Sobrinho e outros milhões de motociclistas profissionais enfrentam chuva, o sol, os perigos do trânsito e cumprem horários muitas vezes se arriscando, deveriam, no mínimo, receber tratamento mais digno da sociedade. Motoboy não é vagabundo e sim, trabalhador, por isso, separar o joio do trigo ajudaria melhorar a imagem dos motoboys já que são discriminados por uma minoria que cometem loucuras no trânsito, além de irresponsabilidade. A regulamentação efetiva do motofrete e a fiscalização da lei federal obrigariam os motociclistas profissionais andarem dentro da lei, identificados através do baú com o número do Condumoto e da Licença Motofrete. Essa padronização, sem dúvida, atribuiria um reconhecimento da profissão como aconteceu com os taxistas de São Paulo que, a partir da regulamentação, tornaram-se referência de bons serviços até fora do Brasil.
O Brasil registra 12 mil mortes por acidente por ano e, segundo o Ministério da Saúde, os acidentes com motos são responsáveis por um aumento de 115% no número de internações em hospitais públicos. Só no estado de São Paulo, 20 mil motociclistas foram parar nas salas de cirurgia, em 2014, número que cresceu em 2015 e 2016. Outro levantamento identificou que nos últimos dez anos o número de mortes provocadas por acidentes de moto aumentou 280%. Por ano essas internações custam quase R$ 30 milhões para o SUS (Sistema Único de Saúde). Há uma certa ignorância de todos em relação aos acidentes, tanto motoristas dos automóveis quanto das motos não se entendem e disputam espaços nas vias públicas, muitas vezes, sendo o motociclista a levar a pior. É preciso atenção. Hoje mais de 23 milhões de motos circulam pelo Brasil. Elas representam apenas 26% da frota nacional contra quase 50% dos veículos de passeio e outros 24% divididos entre caminhões, ônibus etc.
Aparecido não entrou na estatística de óbitos na capital de São Paulo, mas entre os três últimos anos, cerca de 1.000 motociclistas foram recolhidos sem vida no local dos acidentes. Isso é o número de uma guerra civil e carnificina com causa mais que conhecida: a imprudência. Ela surge de todos os lados com motociclistas novos de carta, o acréscimo da circulação de carros mal conservados com seus motoristas sem reciclagem, o volume de automóveis trafegando diariamente, que ultrapassa a casa dos milhões na capital São Paulo, por exemplo, e, claro, a obrigatoriedade dos motoboys de trabalharem por produção. Por isso, obrigados a acelerar e ainda por cima, muitas vezes em motos desreguladas ou com freios e pneus na lona, acabam criando o cenário ideal para os acidentes.
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